quinta-feira, julho 19, 2007

Mariana

Em 2003, na minha primeira visita ao Japão, participei de um festival de estudantes montando um estande de venda de pastéis, representando o Brasil. O estande teve relativo sucesso e, no ano seguinte, meus amigos japoneses resolveram repetir a dose, montando mais uma vez o estande. O regulamento do festival, entretanto, exigia que cada grupo representando um país contasse com pelo menos um participante nativo, e eu já estava de volta ao Brasil.

Pelo orkut, novidade na época, encontrei duas brasileiras que estavam estudando na região de Kyoto. Uma delas morava em Osaka e a outra em Kyoto. Coloquei as duas em contato com a Mayuko, minha amiga japonesa que havia me convencido a participar do festival no ano anterior, e logo elas se acertaram: haveria mais uma vez pastéis no festival de estudantes.

A Mariana, que estudava em Kyoto, encontrou a Mayuko e o resto do pessoal e juntos fizeram experiências de pastéis, e os demais preparativos para o dia do festival. Infelizmente, no dia houve ameaça de tufão, e o evento foi cancelado. Por outro lado a participação no festival incluia um seguro, e eles foram resarcidos com o que investiram para a compra de ingredientes. Mais que isso, como os ingredientes já tinham sido comprados, fizeram uma “sessão pastelada” pois jogar tudo aquilo fora seria um disperdício. Mottainai (もったいない), como se diz por aqui.

Ela continuou seus estudos em Kyoto, mantivemos contato por email. Terremotos e tufões também circulavam pelo Japão naquele ano, mas a Mariana não desanimava.

From: "Mariana"
To: "Drebes"
Subject: Re: Tufões, etc
Date: Mon, 25 Oct 2004 06:18:52 -0200

Eh Roberto, tufao, terremoto, essa terra anda sofrendo tragedia atras de 
tragedia... mas a gente vai sobrevivendo.

Pois afinal, ela sabia que o estresse era temporário, seu lugar era no Brasil.

From: "Mariana"
To: "Drebes"
Subject: Re: Tufões, etc
Date: Wed, 27 Oct 2004 00:54:16 -0200

Arigatou!Temos que reconhecer que o Brasil eh uma terra abencoada, nao eh?
Bjs,
M.

Ao voltar pro Brasil, ela me contou como estava feliz. Contei para ela que faria a seleção da bolsa para Doutorado no Japão, e trocamos nosso último email quando saiu o resultado, quando soube que estava voltando pra cá. Depois infelizmente perdemos o contato.

Ela era uma guria legal. Não pude considerá-la minha amiga, pois nunca nos encontramos pessoalmente, mas tenho certeza de que nos daríamos muito bem.

Mas não vamos nos encontrar. A Mariana Sell estava no vôo 3054 da TAM. Que sua família e amigos tenham conforto. Que a justiça seja feita e outras pessoas legais como a Mariana não tenham que nos deixar tão novas, sem que eu tenha a chance de conhecê-las. Que não sejam vítimas de outras irresponsabilidades absurdas como essa.

6 comentários:

Andre disse...

Sometimes, life sucks big time. Já é a terceira pessoa que eu sei que perdeu amigos no voo. Essa bateu muito perto de casa, ainda estou em choque.

Unknown disse...

Todos sentimos muito pelo acidente da TAM, foi algo muito proxima das nossas vidas.
foi simplesmente estupido.
sei la, espero que fiques bem.
abraços

Rafael Huff disse...

Poxa Drebes, meus pêsames. Até agora estou chocado com a tragédia. Um amigo que mora junto comigo também perdeu um amigo no acidente. Muito foda!

Unknown disse...

Pessoal, valeu pelos comentários, mas eu to bem. Como disse, nem cheguei a conhecer ela ao vivo. Estou mais é indignado com a irresponsabilidade do que qualquer coisa. São várias coisas acontecendo ao mesmo tempo que fazem a gente pensar bastante. Mas tem gente que realmente merece esses pesares, e eu não sou uma delas.

Unknown disse...

Conheci a Mariana antes de ir para o Japão. Ela estava passando férias no Brasil. Nos encontramos no Restaurante Severyna, em Laranjeiras, com o Prof. Domingues. Ela falou sobre o Japão, deu várias dicas e ficamos de nos encontrar por lá.. acabou que não nos encontramos.. Fiquei sabendo agora que a Mariana estava no vôo.. Não dá pra acreditar.. Muita tristeza...

Tiago Fioreze disse...

Impressionante o teu post, Drebes! Fiquei chocado e ao mesmo tempo indignado! Até quando vamos ter que aturar o "jeitinho brasileiro" onde tudo se faz "nas coxas", como tu mencionaste? Muito triste isso... e saber que a chance que alguma coisa mude é pequena, apesar dessa tragédia com o avião da TAM.